2009/06/09

Visto de fora

Num barco deslizante, com vista para um mundo de tropicalidade virgem, quase intocada...verde cobre toda a ilha. Visto de fora, tudo parece normal, como num filme ou numa foto.

Mas ontem eu estive 3 horas naquela selva, a batalhar a inércia dos meus viciados pulmões, ao mesmo tempo intoxicados por uma verdade verde inquestionável. Cheguei ao meu destino, é certo. Foi uma valente batalha, é certo. Mas considero um empate entre eu e a Mãe. Um ponto para cada um, porque jogamos quase sempre em equipe.

É difícil do lado de fora lembrar o que foi, nem dá bem para distinguir os trilhos que tomei, no meio de tanto desordem natural. Mesmo os músculos do meu corpo, ontem no seu esplendôr de existência, agora doem de saudade, torturando cada posição que escolho, aqui, neste barco deslizante.

Uma separação

Gostava dela e ela de mim. Fazia-lhe festinhas enquanto pensava, para crescer, mas era ela na verdade que me fazia crescer no aspecto. Dava-lhe banho, ela dava-me charme. Meia ruiva, sempre envolvida no que dizia, bem junto dos meus lábios.

No calor do Rio, no entanto, tivemos que nos separar. Tornou-se insuportável estar com ela, já não a aguentava mais em mim. Em vez de charme, dáva-me comichão.

Peguei numa Gilette, e expulsei-a de casa. Adeus barba!

Lopes Mendes

Gosto de correr na praia. Gosto de correr à chuva. Quando cheguei à Lopes Mendes, conhecida como uma das praias mais lindas do Brasil, na Ilha Grande, deparado com um céu enebulado e chuvinha miúdinha mas quente, vi a oportunidade de conjugar as duas paixões pela primeira vez. Com a força de uma boa noite de sono e as proteínas de uma açaí bem gostoso, disse que não à apatia do dia chungoso e lancei-me a mais um "Quilómetro" (desta vez era bem mais).

Pézinho na areia, os pulmões, a cabeça, os músculos..o processo era o mesmo mas havia algo diferente no cenário. As gaivotas estava caladas, o Sol não se punha e o lado mais lindo para se olhar era o oposto ao mais, com uma imponente floresta tropical ao lado da areia. Depois de uma fase de adaptação, aprendi a integrar os meus pensamentos com aquele lindo cenário. No fim, o habitual mergulhinho....Ahhhh....Toalha, sandes, chinelo, casa....ou hostel, neste caso.

Voar é fixe, disse-me um passarinho

Foram-me dadas as intruções. Segui-as à risca:

-Mão aqui, outra ali, agarra com força e corre como se não houvesse amanhã.

Assim foi, e depois do custoso sprint, caí de um enorme precipício. Desci uma parede de nevoeiro que parecia não terminar, já descrente do meu futuro neste mundo para além dos breves segundos até ao chão. Até que mudei de direcção.

Ao mesmo tempo que comecei a subir, o nevoeiro foi desaparecendo, e o que o substituiu é difícil pôr em palavras...a cidade Maravilhosa, Rio de Janeiro, bem do alto, a uma velocidade arrepiante, duma distância intimidadora. Limitei-me a calar e apreciar, tanto a estonteante beleza espontânea da cidade como a sensação de...voar. Se andar de Asa-Delta foi alucinante, tendo como fundo a cidade do Rio foi a cereja no topo do bolo. Já cá em baixo, ainda a voltar à realidade com a ajuda de uma àgua de côco e sol q.b. conheci o Gabriel, o Pensador. Tipo tranquilo e bem simpático.

Não se pode dizer que não tenha sido um dia especial...Ficou a foto:

Rugido de vascaíno

O chão urgia debaixo dos meu pés, a um ritmo pouco habitual. À minha volta, que nem tolos, brasileiros cantando com o coração, saltando, gritando numa frenética sinfonia de apoio. "É essa a torcida do Vasco, velho!"- convencia-me o carioca com gestos sem nunca abandonar o ritmo da batida com os pés. E era! Desembaciando os olhos de toda a novidade e emoção que me preenchiam, dava para perceber que o Vasco da Gama era o clube do Rio com influência portuguesa. Por entre as habituais vestimentas pretas e brancas, via-se o vermelho das camisolas oficiais da selecção portuguesa. Atrás de mim, enormes bandeiras envergando orgulhosamente a cruz de malta. Este povo partia unido para uma batalha, numa só voz, a um só tempo no salto.

Ao ritmo do Samba, liam as pautas da memória de canção em canção à espera dos seus heróis. Que lhe trouxessem a glória de mais uma vitória. O jogo ainda nem tinha começado, mas dava para perceber a magia da torcida do Vasco e a mística do Maracanã...

Vi-me a saltar, gritar, cantar, insultar, dançar, e de facto "torcer" por um clube que nunca foi o meu, nunca tinha visto jogar, mas naqueles minutos era o clube do meu coração. E as equipas ainda nem estavam em campo.