2008/11/25

O Momento

Do quente conforto do escuro veio um ruído, um frio, de uns pés que já enregelavam à horas mas só agora acordaram, e um raio de luz que lhe furou a retina acordando meia dúzia de neurónios. Usou-os para insultar a temperatura maldita e amaldiçoar as horas do sono que passam sem satisfazer. Depois de um banho mal tomado, meia penteadela no cabelo e ainda de olhos entreabertos, saiu de casa limpando com a manga do casaco o café que ainda tardava a fazer efeito. Passou a mão, ainda fria pela nuca, como que á procura de um conforto. Cá fora, foi cego por uma fachada de luz.....

- "Fodasse....." - , disse entre a porta de casa e a do carro.

À medida que ia guiando o carro com os joelhos e procurando o seu primeiro cigarro do dia no porta-luvas, aquela luz apaziguou, animando um pouco o seu espiríto e dando espaço para as palpebras conquistarem mais uns milímetros. Uma longa fila de sonâmbulos ia-se empurrando antes do semáforo. Ele conhecia aquela recta. Demorava aproximadamente 5 vermelhos. Tentou com uma pinceladas ao de leve mentalmente planear o dia que aproximava. Olhou para o retrovisor, como que à procura da coragem. Foi interrompido pelo verde.

- "Então? Anda lá!" - buzinou

Escolheu o lugar menos impróprio para estacionar, bateu a porta do carro com convicção, estalou o pescoço com dois gestos secos, lançando os ombros para trás e procurou o número 67. Duas portas abaixo da porta azul, e como lhe tinham dito, mesmo em frente àquele cinema conhecido.
Colocou a chave na fechadura, inspirou antes de a rodar, como que à procura de uma certeza.

- "Vamos...tu consegues...já fizeste isto quantas vezes?" - assegurou à maçaneta.

O sino tocou. O dia chegou. Era agora ou nunca.

No comments: